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Com a reforma tributária, necessária para que o país saia do intrincado e ineficiente sistema em que está emaranhado, um dos setores que foram penalizados é o de saneamento básico. Se nada mudar na regulamentação da reforma, haverá aumento de impostos para o setor, levando a uma redução na capacidade de investimentos das companhias, possível aumento de tarifas e empurrar com a barriga a universalização prevista para 2035.

Mas além dessa questão crucial para o setor, há outros pontos que precisam ser melhorados e ter uma melhor gestão, como forma de reduzir desperdícios e aumentar a eficiência operacional da companhias de saneamento do país, muitas sem condições de ter acesso a crédito.

É sobre esses pontos que Neuri Freitas, presidente da Aesbe e da Cagece se debruça em seu artigo deste mês na revista, ao afirmar que “quando se reporta a eficiência, não se está limitado, apenas, à gestão de recursos financeiros, mas também a um conjunto diversificado de estratégias que promovam a sustentabilidade no extenso prazo. Nesta linha, é essencial que as companhias de saneamento básico trabalhem com vistas a garantir uma nova matriz energética, com custos mais baixos e menos geração de gases de efeito estufa. 

Ademais, é também fundamental que o setor avance em outros pontos estratégicos, especialmente ante a situação de mudança climática, como a diversificação da matriz hídrica e novas fontes de abastecimento de água para os setores agrícola e industrial, de maneira que não provoque a concorrência com a água disponível em rios e reservatórios e que, por sua vez, esse recurso deva ser priorizado para o consumo humano... Ainda quando se reflete sobre a atual matriz hídrica utilizada pela maioria das companhias de saneamento básico no país, é urgente e inevitável evidenciar que o setor necessita avançar com o intento de implantar opções para superar as perdas de água, aliás, um tema operacional que precisa ser cuidado franca e abertamente na discussão em torno da eficiência das companhias de saneamento básico. Sob tal aspecto, também, é importante que haja no Brasil o balanço hídrico do setor pertinente em cada unidade federada. Impõe-se conceder respostas a indagações como estas: qual o volume de água utilizado e quanto se perde, por exemplo, na agricultura e na indústria? O quanto há de prejuízo com fraudes – utilização da água sem outorga? E com a evaporação? É necessário, pois, ir além das perdas no setor de saneamento”.

Cuidar do saneamento é reduzir a pressão sobre o sistema de saúde, dar dignidade aos cidadãos. E a questão climática, umbilicalmente ligada à transição energética, além da reforma tributária, também povoam outras páginas da revista. Os economistas e pesquisadores Tomaz Leal, José Mauro Coelho e Guilherme Mercês defendem que “em tempos de eleições municipais e novos planos de governo, é necessário chamar a atenção para o momento único e a conjuntura desafiadora que demandarão ações concretas de estados e municípios nos próximos anos. Em meio a uma agenda global pela preservação climática que avança, ainda que em uma velocidade inferior ao necessário, a realidade política brasileira acrescentou ao já complexo cenário de mudanças, uma reestruturação do sistema tributário nacional. Ambas as transições, a energética e a tributária, impactarão de forma significativa o sistema produtivo e vão implicar um papel central dos governos como reguladores e indutores das transformações desejadas. Quando tratados conjuntamente, esses movimentos exigem, além da capacidade de planejamento elevada, a busca por sinergias para lograr melhores resultados”.

José Roberto Afonso, Geraldo Biasoto Júnior e Murilo Ferreira Viana começam seu artigo afirmando que “o desempenho econômico do Brasil no período pós-pandemia tem surpreendido analistas, que têm revisado sistematicamente suas projeções de crescimento. Após avanço próximo a 5% em 2021, na saída da crise, a economia brasileira terá crescido cerca de 3% a.a. no triênio 2022-2024. Para muito além dos efeitos dos estímulos da política fiscal do Lula III, o próprio FMI, em recente divulgação, elevou a projeção do PIB potencial brasileiro de 2% para 2,5%, apontando como um dos pilares de tal revisão a significativa expansão recente da produção de petróleo. No médio e longo prazo, no entanto, um dos maiores desafios para o Brasil será transformar em realidade o potencial da transição verde e do crescimento inclusivo, a fim de viabilizar uma dinâmica econômica mais sólida e sustentável”. 

E é dentro desse contexto que os autores acreditam que é “impossível avaliar a evolução da economia brasileira sem reconhecer, em particular, o crescente papel do petróleo, especialmente o rápido avanço da produção no pré-sal. Um perigoso equívoco, no entanto, é comemorar o excelente desempenho do setor no presente e esquecer que ele carece de investimentos, pesados e prementes, para manter a exuberância no futuro. Crescer, e de forma sustentada, exige investimentos fixos, tendo o Brasil das taxas mais baixas do mundo, atrás até das economias menos desenvolvidas e das vizinhas”. 

Outro ponto levantado é que “na contramão da integração da efetiva agenda ambiental e de desenvolvimento, a regulamentação da reforma tributária do consumo, também em tramitação no Congresso, prevê a incidência de imposto seletivo, entre outros bens, sobre a extração e até mesmo a exportação do petróleo”.

O mesmo se aplica ao gás natural (GN), como escreveu Cristiane Alkmin Junqueira Schmidt, em seu artigo de outubro  de Conjuntura onde afirma que “inquestionavelmente a reforma tributária será benéfica para o país, mas esta não pode colidir com outros objetivos legítimos de políticas. Por isso, ao menos enquanto o Brasil ainda fizer uso expressivo de carvão, diesel e lenha, não há razão econômica e social para o GN ter IS. Será um pecado impor o imposto do pecado ao GN” (leia o artigo acessando).

Resultado das drásticas mudanças climáticas que o mundo está vivendo, Bruno Ottoni faz uma avaliação como as enchentes no Rio Grande do Sul impactaram o mercado de trabalho. Segundo seu levantamento, mais “de 17 mil postos de trabalhos formais foram destruídos durante as enchentes no Rio Grande do Sul. Essa perda foi puxada sobretudo pelos setores de agropecuária, indústria e comércio, embora outros setores também tenham sido afetados. Além disso, parte dos trabalhadores que perderam seu emprego formal, podem estar se realocando em vagas com salário menor. Retomar esses postos de trabalho é apenas um dos inúmeros desafios que o estado vem enfrentando desde que as chuvas arrefeceram. Isso reforça a necessidade de discutir e aprimorar esforços de contingência para situações de calamidade, garantindo um suporte robusto e eficiente tanto para empresas quanto para trabalhadores em momentos como esse”.

Luiz Firmino Pereira e Rafael Souza avaliam como um bom planejamento urbano pode ter impactos positivos na vida das pessoas e na economia, citando exemplos malsucedidos de intervenções urbanas no Rio de Janeiro. Para os autores, “há diversos equipamentos urbanos e obras que integram a infraestrutura de uma região metropolitana. Eles acabam por influenciar a forma que o tecido urbano adquire, e, quando bem planejados, facilitam, e mesmo ditam a vida de quem vive na cidade. Entre essas infraestruturas, destacam-se aquelas ligadas à mobilidade (rodovias, ferrovias, metrô, barcas, suas estações, aeroportos, rodoviárias e outros), as ligadas ao saneamento (redes de drenagem, tratamento de esgotos, abastecimento de água, destinação de resíduos sólidos), e as ligadas à habitação (os bairros e seu conjunto de equipamentos como escolas, hospitais, universidades, postos de saúde, estádios, centros comerciais e outros)”.

Citam exemplos malsucedidos de intervenções no Rio, como a encampação do BRT há alguns anos; a quebra e a devolução da concessão das barcas; o anúncio de que a Supervia devolverá a concessão dos trens urbanos; a quase devolução da concessão do aeroporto internacional do Rio de Janeiro e a recuperação judicial da Light. 

Com a proximidade do G20 que será realizado no Rio, Lia Baker Valls Pereira, avalia que num momento em que as instituições multilaterais estão com diferentes graus de dificuldades de produzirem consenso entre os seus membros, o recorte do G20 com menos países é um espaço mais relevante. Hoje, os membros do G20 representam cerca de 85% do PIB mundial, mais de 75% do comércio mundial e cerca de dois terços da população mundial, mas é composto apenas de 19 países e mais a União Europeia

Helio Portocarrero (in memoriam) e Uriel de Magalhães, ao analisarem o envelhecimento da população brasileira – em 2039, o número de pessoas com mais de 65 anos superará o de crianças de até 14 anos. E ainda: o Brasil terá mais aposentados do que trabalhadores ativos dentro de cerca de quatro décadas, defendem que o “sistema previdenciário de repartição, em que gerações mais antigas de trabalhadores financiam as seguintes, como ainda em vigor, no país, está, portanto, dinamicamente inconsistente, em termos financeiros”. E propõem uma mudança: “nossa proposta, na essência, é de que o novo sistema deveria estar baseado em um regime de capitalização das contribuições – e não de repartição, como atualmente (INSS)”.

O artigo, em que é traçada uma ampla análise do sistema previdenciário brasileiro e de outros países, tem sua primeira parte publicado nesta edição. A continuação do trabalho será publicada na próxima edição, de dezembro, da revista.

Nelson Marconi volta a defender, como fez em seu artigo de setembro (leia o artigo acessando) na revista, a elevação da meta de inflação. Segundo ele, “a elevação da meta pode soar como proposta que caracteriza uma conivência com uma taxa de inflação alta, mas na verdade é o contrário; seria também mais realista e incorreria em menores custos para a economia brasileira. Certamente não seria tranquilo fazê-lo; o regime de metas possui um forte componente de expectativas e, uma vez estabelecida determinada meta de inflação, é muito difícil elevá-la sem custos de informação ou reputação. Mas seria necessário corrigir um erro anterior que, à primeira impressão, parece uma tecnicalidade, mas não é; a meta de 3% está impedindo um crescimento maior de nossa economia, pressionando o cenário fiscal e, a médio prazo, a própria inflação. É melhor corrigir agora que posteriormente remediar os custos do descasamento entre a meta e a realidade da inflação brasileira. E será melhor para o próprio comportamento das expectativas inerente ao regime de metas”.

Há controvérsias sobre isso entre os economistas.
Mauricio Canêdo Pinheiro lança mão dos estudos que deram o Prêmio Nobel de Economia para Daron Acemoglu, Simon Johnson e James A. Robinson onde mostram as razões para a diferença no nível de desenvolvimento econômico e social dos países. “De acordo com os referidos autores, políticas econômicas – e mais geralmente instituições, que geralmente também são resultados de escolhas coletivas – importam para o crescimento econômico porque moldam os incentivos dos agentes econômicos na sociedade. Em particular, influenciam investimentos em capital físico, capital humano, tecnologia e a organização da produção. Instituições e políticas econômicas determinam não apenas o potencial de crescimento econômico agregado da economia, mas também a distribuição de recursos na sociedade. A adoção de políticas e de instituições inclusivas geraria benefícios para todos no longo prazo, enquanto instituições e políticas extrativas proporcionariam ganhos no curto prazo apenas para aqueles que detêm o poder.” 

Rubens Penha Cysne, diretor da FGV EPGE, parte do pressuposto de que a fé ou o compartilhamento de um conjunto de crenças pode funcionar como um mecanismo que incentiva a cooperação entre os diferentes atores de uma comunidade. A partir deste ponto, ilustra-se, com o uso dos “jogos de confiança”, como isso pode elevar o bem-estar social de uma sociedade com impactos positivos sobre a economia.

Quais as razões que levaram o Brasil a ter uma malha ferroviária ineficiente? Quais motivos levaram o país a “preferir” as rodovias em detrimento dos trens? De que forma isso pode ser revertido. E há ganhos, e quais, se isso for feito? São perguntas que Marcelo Miterhoff procura responder em seu artigo deste mês, levantando a seguinte questão: “por que promover um setor tão eficiente e rentável como o agronegócio? O produtor agrícola brasileiro tem uma desvantagem competitiva em relação ao estadunidense, pois este conta com subsídios na formação da infraestrutura de escoamento de alta capacidade (hidrovias e ferrovias). Trocar parte dos benefícios concedidos ao setor agrícola nacional, caso do plano Safra, para apoiar a implantação de ferrovia de escoamento da produção tende a ser mais eficiente. Além disso, expandir as ferrovias pode viabilizar outros setores, como o de biocombustíveis no Centro-Oeste”.

Claudio Conceição | claudio.conceicao@fgv.br

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